Produção Organizada
Planejamento da obra requer projeto detalhado do canteiro e levantamento completo das informações acerca de equipamentos, materiais e perfil das equipes que trabalharão em cada etapa
O bom andamento de uma obra, com atendimento aos prazos e custos, depende em boa dose da organização do canteiro e do planejamento adequado das sequências construtivas. Mais do que projetar o edifício, a construtora deve fazer um cuidadoso projeto do canteiro, com plano logístico e planejamento físico da construção. "Do ponto de vista financeiro, as exigências legais não permitem mais que o canteiro seja tratado como uma instalação provisória. Ele passa a ser visto como a fábrica da edificação, e essa terminologia modifica o zelo por esse espaço", diz Maria Aridenise Fontenelle, professora da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa).
A montagem do canteiro deve seguir as diretrizes definidas na Norma Regulamentadora no 18 (NR-18), mas algumas outras ações, tomadas antes do início dos serviços, contribuem para a viabilidade técnica da execução. O planejamento deve levar em conta, por exemplo, a área de ocupação do canteiro de obras, a localização na região onde o empreendimento vai ser construído, a tipologia da edificação, as técnicas e tecnologias construtivas que serão usadas e o dimensionamento das equipes no pico de execução da obra. "Essas informações vão auxiliar a definir o layout do canteiro, a avaliação dos acessos possíveis à obra e o estudo dos impactos da movimentação de caminhões e máquinas para executar os serviços e receber os materiais", afirma Gabriel Borges, engenheiro civil e consultor do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE).
O trabalho começa, portanto, com a coleta de informações. É preciso saber previamente quais equipamentos serão utilizados, o volume dos materiais e suas condições específicas de armazenamento, além do número e do gênero dos trabalhadores. Essas informações são necessárias, pois tanto as áreas operacionais quanto as de vivência precisam estar adequadas para o recebimento dos serviços.
"Nessa etapa inicial é necessário também planejar todas as providências quanto à limpeza do terreno, abastecimento de água, esgoto, energia e telefone, essenciais para iniciar os trabalhos. Há, ainda, questões legais, como as licenças necessárias e a autorização para poda de árvores", diz Borges. O estudo para fornecimento de energia e água é feito antes de se iniciar qualquer serviço e deve prever o volume total a ser utilizado durante a construção. "A partir daí, os pontos de energia elétrica e água vão sendo feitos na medida em que se fazem necessários", afirma Rômulo Carvalho, coordenador de obras da construtora Racional Engenharia.
O levantamento prévio das informações ajuda a definir também os melhores locais para armazenamento de materiais e a movimentação dentro do canteiro. Se a obra estiver localizada em área de acesso restrito a máquinas e caminhões, é necessário definir claramente quais os melhores acessos e horários possíveis para todos os trabalhos. O planejamento logístico evita que máquinas e mão de obra fiquem ociosas, além de impedir a ocorrência de trabalhos semelhantes em locais distantes.
A instalação dos equipamentos deve buscar o melhor aproveitamento deles. "A logística de montagem é o fator mais importante para receber estes serviços no canteiro. As gruas, por exemplo, são montadas em função da logística da obra", diz Rômulo Carvalho. "Elas devem ficar em local onde possam suprir vários pontos do canteiro", completa. Quanto à armazenagem, produtos mais delicados - como materiais inflamáveis - requerem atenção especial. O cuidado também é redobrado em serviços cujos materiais estão mais sujeitos a avarias, como é o caso do fornecimento e instalação de elevadores.
As áreas de vivência também precisam ser planejadas. Rosana de Freitas, consultora em logística de canteiro de obras e professora no curso de Engenharia de Produção Civil na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), lembra que a fase final da obra pode demandar o rearranjo das instalações. "Quando imaginamos o serviço de limpeza para entrega da obra, ele é tradicionalmente feito por mulheres. Por isso, as condições do canteiro devem estar ajustadas para a diversidade de gênero, com sanitários e vestiários reservados para essas profissionais", afirma.
Gestão integrada
Mais importante do que preparar o canteiro para receber cada um dos serviços da obra é estabelecer a gestão global das frentes de trabalho. "Para qualquer que seja o serviço, devem ser avaliadas as suas interferências e inter-relações [com outros serviços]. O processo produtivo é sistêmico", diz Rosana. "Nas obras em que a maioria dos serviços é subcontratada, essa relação é ainda mais delicada, pois o não cumprimento do prazo de um fornecedor acaba impossibilitando a execução do serviço de outro, o que pode trazer para a contratante ônus previstos contratualmente", adverte.
A falta de entendimentos preliminares entre construtora e subempreiteiras também pode ter consequências danosas ao andamento da obra. "Imagine, por exemplo, uma situação em que a contratada - que estipulou em contrato que a contratante deverá fornecer a energia elétrica - descobre que o ponto de fornecimento está distante do ponto de operação. De um lado, o contratante argumenta que a energia está disponível; de outro, a contratada se queixa por não estar sendo plenamente atendida", ilustra Luís Otávio Cocito de Araújo, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Para ele, é indicado estabelecer um plano prévio dos recursos fornecidos pela construtora às subempreiteiras, com todas as suas disposições.
Vale ressaltar que diferentes serviços, em diferentes fases da obra, podem requisitar cuidados específicos. "Considerando o serviço de fundação, podemos pensar que ele é crítico porque exige a abertura de acessos para circulação de equipamentos, ao passo que o armazenamento dos materiais não exigirá ações complexas", exemplifica Rosana de Freitas. "Mas, se considerarmos as instalações, é justamente o armazenamento dos materiais que torna esse serviço crítico", compara a consultora em logística de canteiros.
Para Cocito de Araújo, muitas vezes a falta de preparação adequada dos canteiros está condicionada à necessidade de aceleração da obra. "Para puxar as atividades do caminho crítico, o preparo do canteiro nas etapas iniciais é costumeiramente negligenciado. Em condições como essa, os colaboradores são expostos a condições impróprias de trabalho, como ambiente insalubre, com riscos elevados de incidentes e acidentes", afirma. O professor da UFRJ afirma que esse descuido em busca da rapidez imediata na execução é uma marca e uma mácula da construção civil. "Contabilizar a improdutividade decorrente da falta de estruturação dos canteiros é ação fundamental para dar mais importância ao planejamento dos canteiros. A simples desorganização de um estoque pode custar tempos consideráveis para que se encontrem as peças num processo de montagem", exemplifica.
Riscos do mau planejamento
A falta de planejamento e preparo adequado do canteiro pode levar a retrabalhos, problemas no deslocamento e armazenamento de materiais, problemas com segurança e geração excessiva de resíduos, além da subutilização ou ociosidade da mão de obra contratada. Essas ocorrências já são um problema em si, mas o pior é que todas elas costumam causar atrasos no cronograma. "Existe, ainda, uma consequência não mensurável: desgaste físico e emocional dos profissionais com o estresse da situação inesperada", alerta Rosana de Freitas, da Uneb.
"A escolha inadequada de um sistema de transporte vertical, por exemplo, pode comprometer a produtividade planejada para a execução dos serviços. Já um erro no dimensionamento dos equipamentos de produção ou transporte, por sua vez, pode gerar tempos desnecessários de espera nas equipes", exemplifica Gabriel Borges, consultor do CTE. Tudo isso tem implicações financeiras, pois resulta em desperdício de insumos e desvios nos serviços. O arquiteto e professor da Escola de Arquitetura da Universidade Federal Fluminense (EAU-UFF) Ivan Xavier lembra que empreendimentos de médio e grande porte costumam contar com profissionais especializados em preparação de canteiros.
O professor defende que "na execução de uma obra, há necessidade de se preparar um Projeto do Sistema de Produção (PSP)". Esse projeto deve considerar alguns pontos: divisão e sequenciamento da construção do empreendimento em zonas de trabalho (layout); sequência em que todas as equipes se deslocarão por estas zonas (logística); análise do tipo de trabalho requerido para as equipes; precisão na medida do tempo; e previsão de docas para armazenamento de material e acessos.
No PSP são considerados ainda, segundo Xavier, a localização dos estandes de vendas, almoxarifados, escritórios, refeitório e a infraestrutura de instalações elétricas e hidráulicas. "Para o bom rendimento e produtividade, o Sistema de Produção de um empreendimento está condicionado à organização e ao preparo do canteiro, assim como o posicionamento de todos os elementos relacionados à logística", diz.
Responsabilidades
Para o professor da UFF, o ideal é que a organização do canteiro de obra e do PSP não sejam responsabilidade única e exclusiva do engenheiro residente. "Esta é uma tarefa essencialmente multidisciplinar, que deve envolver vários profissionais, desde diretores e gerentes até engenheiros, arquitetos, mestres, encarregados e empreiteiros", afirma. O desenvolvimento do PSP pressupõe conhecimento completo do projeto, das condições do terreno, da melhor logística de apoio a ser empregada, das principais técnicas e tecnologias envolvidas, além do estudo do cronograma de execução e a clareza do cronograma de permanência de mão de obra e materiais.
O departamento de suprimentos é essencial nesse processo, orienta Rosana de Freitas, da Uneb. "A área de suprimentos colhe informações relativas às necessidades do contratado para realização do serviço - mas isso exige que os profissionais desse setor tenham visão logística, ou seja, que conheçam os materiais e o fluxo dos serviços", afirma.
A prática, no entanto, é bem diferente da teoria. Gabriel Borges conta que o planejamento e preparação do canteiro geralmente ficam a cargo da área de engenharia da construtora e que, dependendo da estrutura da empresa, a responsabilidade direta pode recair sobre o gestor do contrato ou mesmo sobre o engenheiro da obra. Afinal, é ele quem deve conhecer os projetos, cronogramas, metodologias construtivas e o plano de ataque da obra - e é quem participa de todo o processo de análise, desenvolvimento do projeto e planejamento logístico do canteiro.
É importante que as experiências dos últimos canteiros instalados pela construtora, colhidas pelos integrantes da equipe, sejam trazidas para a discussão. Se para implementar canteiros mais complexos as construtoras já podem contar com consultores especializados, é possível até mesmo ter profissionais contratados para ajudar a gerir o canteiro. "Já é comum a contratação de equipes especializadas em logística para assessorarem ou até mesmo conduzirem o recebimento, estocagem e distribuição dos insumos", diz Cocito de Araújo.
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